Mercadorias Perigosas: ADR 2021


Com a entrada de um novo ano impar, entram em vigor mais um conjunto de alterações regulamentares no transporte de mercadorias perigosas, com impacto nos diferentes modos de transporte e consequentemente também no transporte rodoviário (ADR).

A primeira grande alteração prende-se com o nome do acordo que, por proposta de Portugal validada na Conferência das Partes Contratantes realizada em Genebra em maio de 2019, veio consagrar a designação de “Acordo relativo ao transporte internacional de mercadorias perigosas por estrada”, deixando a referência à condição de “europeu” por não ser consentânea com a atual, e espera-se ainda mais com a futura, abrangência geográfica.

As novidades regulamentares, que entraram em vigor no passado dia 1 de janeiro, encontram-se alinhadas com a 21.ª edição das Recomendações para o transporte de mercadorias perigosas da Organização das Nações Unidas, gozam de um período transitório geral que se estende por seis meses, coincidente com o prazo aplicável aos Estados Membros da União Europeia para a transposição para o direito nacional.

Os efeitos da atual pandemia foram também sentidos no âmbito do ADR, que com a supressão da reunião de maio de 2020 do WP.15 impediram a aprovação de algumas disposições modais que se encontravam em avançado estado de reflexão e discussão.

De seguida, de forma não exaustiva, apresentam-se algumas das alterações vertidas na edição de 2021, nas quais se destacam (pelo número) as novas orientações e normas introduzidas pela Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA).

Por exemplo, nas definições e consequentemente disperso nas rubricas pertinentes das diferentes partes, deixa-se de fazer referência a “intensidade de radiação” para se indicar “débito de dose” e é revista a descrição associada ao “Índice de Transporte”.

Desde logo são introduzidos 4 novos números ONU, sendo 3 dessas rubricas afetas à classe 1 – Explosivos e uma às matérias infecciosas para os humanos e para os animais:

UN 0511 DETONADORES de desmonte ELETRÓNICOS programáveis 1.1 B
UN 0512 DETONADORES de desmonte ELETRÓNICOS programáveis 1.4 B
UN 0513 DETONADORES de desmonte ELETRÓNICOS programáveis 1.4 S
UN 3549 RESÍDUOS MÉDICOS INFECCIOSOS PARA OS SERES HUMANOS, CATEGORIA A, sólidos, 6.2; ou
UN 3549 RESÍDUOS MÉDICOS INFECCIOSOS apenas PARA OS ANIMAIS, CATEGORIA A, sólidos

Estas novas entradas na lista de mercadorias perigosas, têm implicações na tabela das isenções por quantidade transportada (1.1.3.6) que vem permitir contemplar estes novos números ONU.

Ao nível das definições também existem novidades, que vão para além das já habituais atualizações das edições/versões do Livro Laranja (Regulamento Tipo da ONU), Livro Púrpura (GHS) e Manual de Ensaios e de Critérios. É o caso da “Temperatura de Polimerização Auto-Acelerada (TPAA)” e da “Temperatura de Decomposição Auto-Acelerada (TDAA)” e da definição de “Operador de contentor-cisterna ou de cisterna móvel”, que passa a ser qualquer empresa em nome da qual o contentor-cisterna ou a cisterna móvel são operados.

Em matéria de responsabilidades de segurança dos intervenientes, existem alterações aplicáveis aos enchedores e aos descarregadores. No primeiro caso, a redação agora dada poderá ser mais clara na necessidade de observância das taxas de enchimento para as cisternas que não sejam dotadas de anteparas ou quebra-ondas e no caso dos descarregadores estes passam também a estar obrigados à elaboração do relatório de acidente, nos casos aplicáveis.

Na Parte 1 é ainda relevante o número de modificações introduzidas no Capítulo 1.6, em especial no que se refere a medidas transitórias relacionadas com o transporte de pacotes de matérias radioativas, sendo também significativas as novidades aplicáveis a este tipo de matérias no domínio das disposições gerais do Capítulo 1.7, em linha com o que já anteriormente foi referido.

As matérias perigosas de alto risco passam agora também a incorporar os explosivos da Divisão 1.6 e os novos números ONU da classe 1, qualquer que seja a quantidade transportada.

No que respeita à classificação das mercadorias perigosas, a classificação de mercadorias (que pode também incluir os resíduos) passa a também poder ser condicionada pela presença de certos objetos, como é o caso de transformadores e condensadores contendo determinadas soluções ou misturas.

Para além de pequenas alterações/correções realizadas em algumas das classes, como por exemplo na atualização de normas, existem outras de maior relevância na classe 7 e na classe 6.2, esta última diretamente relacionada com o novo UN 3549.

Fruto de um maior entrosamento com o Manual de Ensaios e de Critérios, o Capítulo 2.3 relativo aos métodos de ensaio, sofre algumas simplificações para as misturas nitradas de celulose da classe 4.1.

No que respeita à Parte 3, que compreende as listas de mercadorias perigosas, em especial o Quadro A (ordenada por número ONU, permitindo a determinação das disposições particulares e especiais aplicadas a cada mercadoria perigosa); para além dos quatro novos números ONU, são mais de uma centena as alterações introduzidas, com maior ênfase na coluna 6, relativa às “disposições especiais”.

Mesmo antes de entrarmos no Quadro A, de acordo com o 3.1.2.8.1.4, existe agora a possibilidade apenas aplicável aos números ONU 3077 e 3082, de apresentarem como nome técnico (que complementa a Designação Oficial de Transporte) qualquer designação oficial de transporte constante na lista de mercadorias perigosas, na condição desta não ser uma rúbrica n.s.a.* ou tenha assinada a disposição especial 274, por exemplo: UN 3082 matéria perigosa do ponto de vista do ambiente, líquida, n.s.a. (tintas).

O Capítulo 3.3 sofre alterações em quase 20 disposições especiais e acolhe mais cinco novas disposições, das quais se destaca a DE 390 aplicável a volumes contendo pilhas de lítio em equipamentos ou embaladas com equipamentos, que vem obrigar a novas regras de marcação.
Recordemos que muitos dos equipamentos que hoje possuímos ou comercializamos nas mais diversas áreas, são alimentados ou contêm pilhas ou baterias de lítio e que por isso, salvo exceções perfeitamente identificadas no ADR (ou outro regulamento modal aplicável), terão que cumprir disposições para o transporte de mercadorias perigosas.

São também introduzidas alterações na DE 375 relativa ao transporte de pilhas ou baterias defeituosas ou danificadas.

Saliente-se que, os UN 3528 e 3530 relativos às várias variações de motores de combustão interna ou máquinas de combustão interna alimentadas a combustíveis líquidos (que de acordo com a disposição especial 363 em determinadas condições estariam dispensados da aplicação do ADR, exceto no que respeita ao disposto na referida disposição especial) passam agora a estar obrigados à colocação de painéis laranja e consequentemente terão que cumprir as restrições à circulação em túneis, quando aplicáveis.

No que respeita às instruções de embalagem no Capítulo 4.1, é suprimida a P801a, relativa ao
acondicionamento de acumuladores usados, passando estes a ser exclusivamente embalados em
conformidade com a instrução P801, que foi para o efeito alterada.

Como não poderia deixar de ser, foram também introduzidas neste domínio algumas alterações aplicáveis ao acondicionamento de pilhas e baterias de lítio (P&BdL), com a inclusão de um novo parágrafo na instrução P903, contemplando os equipamentos que contenham ou sejam embalados conjuntamente com P&BdL.

Foi criada uma nova instrução para “grandes embalagens”, a P622, para o acondicionamento de resíduos afetos ao novo UN 3549.

No que respeita às cisternas móveis, a TP19, do Capítulo 4.2, aplicável ao UN 1017 CLORO e ao UN 1079 DIÓXIDO DE ENXOFRE, tem uma nova redação que obriga à realização de ensaios por ultrassons em fases intermédias aos ensaios periódicos, para garantir que a espessura mínima não é ultrapassada.

As regras da Parte 5, definidas para a expedição de mercadorias, sofrem também diversas alterações no que respeita à marcação e informação requeridas para a classe 7. Para além disso, a marca do 5.2.1.9.2, relativa às P&BdL, passa a ter as dimensões “normalizadas” de, pelo menos 100 mm x 100 mm. Segundo o 5.3.2.3.2, passa a existir um novo número de identificação de perigo aplicável ao transporte em cisternas, o 836, para matérias corrosivas ou pouco corrosivas, inflamáveis (ponto de inflamação entre 23ºC e 60ºC, inclusive).

No que respeita ao documento de transporte, sempre que os itinerários prevejam o atravessamento ou a existência de restrições em túneis, de passa a ser obrigatória a colocação da referência (-), quando esta é indicada na coluna 15 do Quadro A.

O Capitulo 5.5, que vê corrigidas algumas disposições relativas ao uso de gelo seco, passa a contar com uma nova secção 5.5.4 contemplando as “mercadorias perigosas contidas em equipamentos em utilização ou destinados à utilização durante o transporte, fixas ou colocadas em volumes, sobrembalagens, contentores ou compartimentos de carga”.

Eis um resumo expresso nas 9 Partes do ADR:


 Texto Parte 1 Parte 2 Parte 3 Parte 4 Parte 5 Parte 6 Parte 7 Parte 8 Parte 9
Novo 18 25 20 23 13 73 2 0 1
Alterado 31 39 13 35 11 93 3 4 0
Suprimido 6 7 5 6 2 15 0 0 1
Total 55 71 38+103 64 26 181 5 4

No que respeita à Parte 6, onde se definem as questões construtivas, de ensaio e de aprovação das diferentes formas de acondicionamento previstas no ADR, existem diversas alterações no que respeita à utilização de normas, em especial no Capítulo 6.2 para as garrafas e demais recipientes sob pressão e no Capítulo 6.8, para as cisternas rodoviárias. É claro que, uma vez mais, se encontram presentes várias adaptações resultantes da atualização de regras emanadas pela AIEA, aplicáveis aos pacotes radioativos.

A existência de mais do que uma marca de aprovação UN, que já tinha sido contemplada para as embalagens do Capítulo 6.1, passa a ser também possível para os GRG (Capítulo 6.5) e para as grandes embalagens (Capítulo 6.6).

Como para transporte terrestre a aplicação da Convenção sobre Segurança em Contentores (CSC) poderá não ser de cumprimento obrigatório, a UIC reviu as prescrições relativas à conceção, construção e aprovação dos contentores para granel utilizados em transporte ferroviário, o que teve implicações no Capítulo 6.11 e Capítulo 7.1, quanto à admissibilidade deste tipo de equipamentos.

A disposição CV36, aplicada ao transporte de gases em veículos cobertos ou fechados passa a ter uma nova redação, mais clara e estabelecendo princípios de segurança e alerta contra potenciais fugas de produto.

A UNECE reforça o seu papel na disponibilização de informação relativa ao ADR, com uma nova redação do parágrafo 8.2.2.8.6, para o fornecimento ao secretariado dos modelos nacionais de certificado de condutores ADR emitidos.

São feitas algumas afinações no Capítulo 8.5, nas disposições S1, S16 e S21, tentando um alinhamento das disposições aplicáveis à vigilância dos veículos abrangidos com as disposições relevantes do Capítulo 1.10 em matéria de segurança pública.

Como consequência da não realização da sessão de maio do WP.15, a Parte 9 não tem praticamente alterações aplicáveis, apesar da existência de alguns documentos em discussão.

Devo referir que esta não é uma listagem exaustiva das alterações introduzidas, cujo detalhe poderá ser consultado no site da UNECE e brevemente na edição do ADR 2021 versão portuguesa, publicada pela Tutorial.


07 maio 2021

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